Saltar para: Posts [1], Pesquisa [2]

Tuga em Londres

A vida de uma Lisboeta recentemente Londrina.

Começar um novo emprego durante a pandemia

Recebi um e-mail do meu novo chefe no dia anterior a começar o novo emprego com um documento onde descrevia o meu 'onboarding'. Ao ler ao longo do documento comecei a ficar entusiasmada com o que me esperava - as coisas novas que ia aprender, as novas pessoas que ia conhecer, e pôr o meu cérebro a funcionar em modo de trabalho novamente. Mas até aí, aquela sensação de entusiasmo que geralmente marca os dias anteriores a começar um novo trabalho, era quase inexistente. Afinal, ia começar a trabalhar de casa, num ambiente virtual, através de reuniões de Zoom, mas rodeada pelo espaço habitual no meu próprio quarto. Como foi a experiência de começar um novo trabalho a partir de casa? Foi melhor do que pensei, mas sem dúvida que teria preferido começar num escritório. Ficam as principais diferenças:

 

O vestuário

Foi a primeira vez em que comecei um novo emprego em que não me deu vontade para ir às compras para fazer um update do guarda-roupa. Afinal, para quê? Ninguém vê o que tenho vestido para baixo da zona dos ombros. Também não preciso de ter aquela sensação de estar 'power dressed' para entrar no escritório pela primeira vez e começar a conhecer os novos colegas. Isso não quer dizer que eu fosse escolher ficar de calções do pijama no meu primeiro dia de trabalho que, mesmo que os meus colegas não vissem isso, eu sabia o que tinha vestido, por isso quis usar roupa em que me senti-se profissional. Talvez se já lá estivesse a trabalhar há imenso tempo, a roupa que usasse não fizesse qualquer diferença. Imagino que as pessoas quando começaram a trabalhar em casa durante o lockdown em empresas onde já estivessem confortáveis, tenham colocado o seu guarda-roupa profissional de parte, ou pelo menos a parte debaixo. Mas esse não é o meu caso. Por isso quis vestir-me adequadamente como se fosse para o escritório, e usei maquilhagem para conseguir disfarçar aquele ar de quem acabou de sair da cama. Esta sexta-feira que passou fizeram 8 dias desde que comecei o novo emprego, e pelo menos para já, tenho continuado com o mesmo hábito de me vestir mais ou menos como se fosse para o escritório - menos os sapatos e o soutien, que depois desde meses todos de 'liberdade' acho que já não sou capaz de passar o dia todo apertada. 

 

O escritório

Eu sempre soube que o meu apartamento não era muito grande, mas desde o lockdown, parece mais pequeno do que sempre, por não ter o espaço suficiente para se criar uma zona de 'escritório' separada, sem ter que influenciar negativamente a decoração do espaço. O meu Inglês já tinha ocupado a mesa de jantar, que se encontra no nosso open plan entre a cozinha e a sala de estar, como a sua secretária. Substituiu uma das nossas cadeiras bonitas em volta da mesa, por uma cadeira de escritório, e tem um segundo ecrã que coloca em cima da mesa todas as manhãs e tira ao final do dia para podermos utilizar como mesa de jantar. 

Eu tive que encomendar uma mesa de secretária pequena para colocar num canto do quarto, que se dobra à noite para não ocupar espaço, e tenho também uma cadeira de escritório. Durante o lockdown sentava-me maioritariamente nas cadeiras da mesa da varanda ou no sofá, mas nenhum dos casos é confortável para estar horas a fio sentada no mesmo local. Portanto, tivemos mesmo que ter as cadeiras de escritório apesar de não terem qualquer lógica estética para estarem cá em casa. Com esta situação agora também não sei quando nos vamos poder livrar daquelas cadeiras porque mesmo quando se voltar ao escritório, não será todos os dias. Portanto, ou tem que haver uma vacina para o Covid, ou temos que mudar para uma casa maior. Até lá, vamos ter que continuar a viver num espaço pequeno com dois semi-escritórios totalmente fora do contexto, e para mim que adoro um design de interiores minimalista, não é nada ideal.

 

escritorio-quarto.jpg

 

Os colegas

Entre reuniões de Zoom e conversas no Slack, tenho vindo a conhecer os colegas aos poucos e poucos e para já tem sido uma experiência agradável. Na minha primeira semana organizaram um Zoom Happy hour para os novos colegas, que fui eu e outra rapariga que também começou na mesma semana que eu, mas não deixou de ser um Zoom um pouco estranho, porque de repente está-se numa chamada com imensas pessoas e onde cada uma tem que falar de cada vez. Quando ninguém fala há aquele silêncio desconfortável. E sendo que a maioria dos colegas se encontra no horário do Pacífico na costa oeste dos EUA, apesar de ser 'happy hour', ninguém está a beber álcool por ser de manhã para eles. Não é bem como os 'welcome drinks' no pub habituais que se costuma ter com os colegas na sua primeira semana num novo emprego. 

 

O trabalho em si

Começou em força. Talvez até demais porque ainda não consegui terminar às 18h que é o meu horário de saída. Numa situação ideal adorava ter mais tempo para fazer uma boa análise da situação actual da empresa, preparar a estratégia e o plano para o resto do ano e só depois começar nas actividades do dia-a-dia, mas claro que isso não é possível porque já existem imensas coisas planeadas para acontecer, e tenho que tratar delas enquanto defino os novos projectos também, portanto há imenso que fazer, mas de forma geral estou a gostar da experiência. 

Os altos e baixos de procurar emprego durante a pandemia

Fez no dia 14 de Julho exactamente 6 meses desde o dia em que soube que o meu cargo na empresa anterior ia desaparecer, e como tal eu ia ficar sem emprego. No dia 15 comecei o meu novo emprego. 

 

Foram 6 meses de desemprego marcados por uma pandemia, pelos mesmos anúncios de emprego durante meses, por falta de resposta e por rejeição às aplicações. 

 

Antes de levarmos com uma pandemia em cima, até que a procura de emprego não estava a correr mal. Tinha enviado umas 10 aplicações, começado a falar com os recrutadores e tinha sido chamada para uma entrevista. Depois veio o Covid. A entrevista foi adiada para uma data incerta, outros recrutadores informaram que os cargos tinham sido colocados em pausa, e comecei a ver uma redução significativa no número de empregos anunciados, ou via sempre os mesmos empregos anunciados. Pela altura de Abril-Maio, quase todos os empregos que via anunciados novos, eram anunciados por agências de recrutamento acerca de uma empresa com nome oculto, e quando aplicava para esses, quase nunca obtive resposta, o que me faz pensar que eram maioritariamente anúncios falsos pelas agências de recrutamento apenas para conseguirem continuar a receber CVs e manterem-nos nos ficheiros para eventualmente quando tivessem empresas clientes, pudessem ter também detalhes de candidatos. 

 

Digamos que não foi o período ideal para procurar emprego, quando milhares de empresas estão a sofrer financeiramente para sobreviver, e têm que cortar cargos ou pedir aos empregados para não irem trabalhar e coloca-los em apoio financeiro através do Estado. O que me valeu mesmo é o facto da minha experiência profissional ter sido maioritariamente em empresas de tecnologia, por isso, quando a quarentena começou a aliviar em finais de Maio, também comecei a ver o número de ofertas de emprego na minha indústria a aumentar um pouco, e depois vim a descobrir que este cargo com que fiquei também já tinha sido publicitado no início do ano, mas com a pandemia, também o colocaram em pausa durante uns meses. 

 

Não foi propriamente uma altura fácil a nível de emprego e sei perfeitamente que ainda não estamos numa situação muito melhor, mas aos poucos e poucos esperemos que as empresas se sintam mais confortáveis para voltar a recrutar. Acho que me ajudou o facto de ter tido perfeita consciência de que, o mais provável, era de ter que esperar alguns meses até conseguir novo emprego. Continuei durante todo o período a enviar CVs  sempre que encontrasse algum anúncio relevante, mas também não dedicava muitas horas à procura porque sabia que estar sempre a pensar nisso não seria saudável. E também sabia que, eventualmente, iria encontrar um emprego, e que quando isso acontecesse, eu iria ter pena se não tivesse aproveitado o tempo que tive livre. Por isso dediquei-me a alguns projectos pessoais que já queria começar há muito, mas que nunca tinha tido tempo antes, e isto claro, para além de aprender a fazer pão em casa, e dar muitos passeios de bicicleta e a pé pelas mais variadas zonas de Londres. Agora, ao olhar para trás, gostei da forma como ocupei o meu tempo, e apesar de não ter feito tanto quanto queria, mesmo assim, acho que o aproveitei da melhor forma possível, tendo em consideração as condições em que estávamos. 

Screenshot 2020-07-19 at 15.52.30.png

 

Durante este período eu fui apontando todos os empregos a que me candidatei e o que estava a acontecer com cada um deles, e é um pouco decepcionante olhar para as estatísticas, mas acho que reflectem um pouco o mercado. Chateia-me é que a maioria das empresas nunca quiseram perder tempo sequer para dizer que não iam avançar com a aplicação. Perdi tanto tempo a preencher formulários e escrever cartas de apresentação para cada um desses empregos, que o mínimo que gostaria de receber em troca, seria uma resposta à minha aplicação. Acho que é uma grande falta de respeito para com os candidatos. 

 

Ficam as minhas estatísticas dos últimos 6 meses: 

  • Empregos a que me candidatei: 60
  • Não obtive resposta: 36
  • Recebi email a rejeitar a aplicação: 15
  • Recebi email a informar que o cargo já tinha sido ocupado: 4
  • Recebi email a informar que o cargo tinha sido colocado em pausa: 4
  • Empresas com que entrevistei: 2 (uma apenas entrevistei com o recrutador e nunca mais ouvi nada deles. A outra foi a com que fiquei com o emprego)
  • Número de entrevistas: 6
  • Diferentes versões do CV: 17
  • Emprego conseguido: 1

 

Primeiras visitas aos retalhistas após o lockdown

Para os leitores que seguem o Tuga em Londres à algum tempo, concerteza que não se vão admirar de eu ser das primeiras pessoas a fazer visitas aos retalhistas após o lockdown. Mal podia esperar! Fico também muito grata por todas as pessoas que não pensam como eu, porque isso faz com que os retalhistas, neste momento estejam confortáveis e com muito espaço para se poder fazer o distanciamento social que se pretende. Não sei se a mesma coisa se vai verificar quando o bom tempo voltar a Londres, mas pelo menos, para já, tenho gostado das minhas experiências nos retalhistas. 

 

Não fui logo no sábado, quando as restrições foram levantadas, mas no Domingo, quando estava a voltar a casa de uma passeio de bicicleta, enviei uma mensagem ao meu Inglês, se queria voltar ao nosso pub local. Fazia parte da nossa rotina de Domingo, quando não tínhamos planos com outras pessoas, de passar uma ou duas horas no final do dia no pub local à conversa. O dia até que não estava muito frio, por isso lá fomos. No caso deste pub, ainda se mantém aberto apenas na zona exterior. Eles mantêm uma mesa à entrada do pub, que não permite a entrada de clientes, a não ser que queiram ir à casa-de-banho. Pedimos e pagámos as nossas bebidas e voltámos para o terraço. Quando chegámos, havia uma mesa vazia, e devo confessar que, se não houvesse nenhuma, nem sequer iria pedir a ninguém para partilhar mesa, apesar de serem mesas longas. Prefiro manter a tal distância e também não quero fazer ninguém desconfortável ao pedir para partilhar mesa. Mas lá ficámos durante um pouco de tempo a apreciar o momento em que podemos voltar ao nosso pub local depois de todos estes meses. Não me senti nada desconfortável porque até estava a mais de 2 metros da qualquer outra pessoa. 

 

No dia seguinte, no entanto, voltei a ir a outro pub com uns amigos e a experiência já foi mais próxima daquilo que se pode esperar de um pub durante os próximos tempos - tinham um sistema de um sentido para entrada e saída no pub, não era permitido estar parado em pé no meio do pub, e todos tinham que estar nas suas respectivas mesas, sentados a pelo menos 1 metro de distância das pessoas com quem estavam na mesa com quem não vivessem, e as mesas estavam todas espaçadas a mais de dois metros de cada uma. Isto também foi possível porque o pub em questão era bastante grande, com um grande terraço, onde estávamos. Não sei se funcionará tão bem em pubs mais pequenos. Outras coisas que notei diferentes, foi o facto de disponibilizarem gel para desinfetar as mãos, só poderem entrar duas pessoas de cada vez na casa-de-banho, e a colocação de setas e gráficos no chão para indicar o caminho a percorrer e a avisar do distanciamento de 1 metro necessário entre pessoas. novamente a experiência foi boa e senti-me perfeitamente segura em termos da distância necessária das outras pessoas.

 

Hoje, tive a minha primeira experiência de passar a tarde num café. Escolhi o Mare Street Market em Hackney porque tem um espaço enorme, e ainda não me sinto confortável para me sentar num café pequeno. Adoro estar a fazer os meus projectos no computador enquanto estou num ambiente de café, e sinceramente já estava mais que farta de estar a olhar para o mesmo local em casa, todos os dias, durante todos estes meses. Mais um bocado e dava em doida! Aqui foi o primeiro estabelecimento em que efectivamente fiquei lá dentro, por isso optei por me sentar numa mesa alta virada para a janela porque ali sabia que ninguém se iria sentar ao meu lado, e também não estava a ocupar uma mesa grande. A gerência também tinha tudo muito bem organizado - as pessoas têm que esperar para ser sentadas pelo staff, o que certifica que ninguém se vá sentar a menos de um metro de mais ninguém. Lá dentro também há um sistema de um sentido orientado por setas no chão, existe um limite de 6 pessoas por casa-de-banho (por existirem 6 cubículos), e na zona do Deli, todas as sandes e saladas estavam cobertas por um plástico, havia um painel de vidro entre os clientes e os empregados de forma a distanciar-nos e também ofereciam desinfectante para as mãos à entrada. Durante o tempo que lá estive, também me senti super confortável sem qualquer problema em que as pessoas conseguiam manter a distância e algumas mesas, até estavam vazias. 

 

IMG_3378.jpg

 

Saída de lá, fui para o cabeleireiro. OK, isto a escrever assim tudo, até parece que não tenho feito mais nada do que ir a retalhistas, mas calhou serem visitas próximas e, enfim, tinha saudades de me sentar num café e num pub. Só não tinha saudades do cabeleireiro mas esse foi mesmo por necessidade. No caso da experiência no cabeleireiro, esta foi um pouco diferente porque é mais difícil manter o distanciamento. Os trabalhadores estavam todos de máscara, mantinham a porta aberta para entrar o ar, e também tinham gel desinfectante disponível, mas por exemplo, quando lavei a cabeça, tive que tirar a minha máscara durante a lavagem para que fosse possível tirarem a tinta, e claro que, todo o tempo, alguém estava junto de mim para me tratar do cabelo. Houve um pouco menos conversa do que o normal porque, não só a máscara é inconveniente para se ter uma conversa, mas também existe mais perigo de transmissão quando se está a falar, por isso a conversa falhou. E também não houve a oferta do café ou chá habitual, nem haviam as revistas de fofoca do costume para ler, tudo com o seu intuito de evitar que várias pessoas toquem no mesmo material. Mas gostei de ver que, quando a cliente anterior a mim saiu, desinfectaram a cadeira e a prateleira em frente com um spray e outro produto. Mesmo assim, com todos os cuidados, se tivesse que escolher a experiência retalhista que achei menos segura, teria mesmo que dizer que as condições no cabeleireito foram as que me trouxeram menos segurança, mas acho que isso tem mesmo a haver com a natureza de proximidade que é inevitável nesta situação. 

 

Gostei de ver como os diferentes retalhistas estão a adaptar-se às mudanças e estão a tentar proporcionar as melhores condições possíveis para a segurança de todos nós. 

 

100 dias de lockdown em fotos

Marcou esta semana os 100 dias de 'lockdown' no Reino Unido. Mal dá para acreditar que já estamos há tanto tempo nisto mas é um facto. Durante este tempo todo, a minha vida, como a da maioria da população Britânica e do mundo, tem sido passada em casa, mas fui captando alguns momentos ao longo deste período e aqui fica a história:

 

Aprendi a fazer pão, e felizmente agora os meus pães parecem muito mais com o da direita do que os da esquerda

LD-14.JPG

 

E fartei-me de fazer doces, porque nada como nos encher-mos de açucar quando estamos fechados em casa sem fazer nenhum 

LD-2.JPG

 

Ah, e claro que me entreti a experimentar novas receitas culinárias

(basicamente, mal saí da cozinha)

LD-4.JPG

 

Socializei entre jantaradas e bebidas através do Zoom

LD-5A.jpg

 

E dancei por casa ao som dos muitos streams de música ao vivo

LD-3A.jpg

 

Durante o dia passei muito tempo dedicada a vários projectos novos e outros antigos e claro, à procura de emprego, se bem que entre Março e Maio isso era quase impossível 

LD-15.JPG

 

Quando saía de casa passava o tempo em filas

LD-13.JPG

 

Ou ía passear de bicicleta pelas ruas e parques de Londres

LD-1.JPG

 

E muitos kilómetros eu percorri a pé pelos canais de Londres

LD-6.JPG

 

Londres parecia uma cidade fantasma com todas as lojas fechadas

LD-9.JPG

 

Comecei a encomendar comida e bebida online

LD-12.JPG

 

Gostei de ver a comunicação espalhada pela cidade com o intuito de nos animar e encorajar a ajudar uns aos outros

LD-10.JPG

 

Quando as condições começaram a ficar menos restritas passei algumas tardes solarentas pelos parques e a ter os primeiros encontros com amigos à distância

LD-7.JPG

 

Esta semana comecei a ver os primeiros sinais de preparação de abertura dos bares e restaurantes para este fim-de-semana

LD-16.JPG

 

A vida vai finalmente começar a aproximar-se um pouco mais da normalidade com a abertura dos bares, restaurantes, cabeleireiros e afins. Enquanto o virús por aqui andar, não vai ser igual como era antes, mas é um passo no caminho certo.